Dias ensolarados

  • por

Ecos do Passado XIV

         O dia amanheceu ensolarado e foi se aproximando do meio dia com ares ameaçadores. Quase por volta de uma hora da tarde, algumas nuvens começaram a aparecer tisnando o azul celeste de um cinza escuro, mas muito espaçadas. Não havia concentração. Quando os ponteiros do relógio corriam lentamente para alcançar quatro horas da tarde, o céu já estava completamente escuro. Não havia dúvida que esse dia não terminaria como os outros dias, claros, ensolarados e ainda quentes.

         Luiz, recostado no espaldar da cadeira antiga refletia na varanda de casa. Um cão, animal de rua, aproximou-se da casa, farejando, olhando alternadamente para os lados, para o alto e para baixo, cabisbaixo, talvez assuntando o que viria de vir, o que poderia acontecer daquele momento em diante ao invadir terreno alheio. Fixou, com firmeza, seu olhar desalentado na direção de Luiz, como a solicitar ajuda, socorro imediato. Estava faminto. Ele queria dizer, com seu olhar implorativo, que estava com fome. Evidente. Estava com fome e procurava amparo. O animal era mais um enjeitado da vida, sem lugar certo para pernoitar, embora tivesse um vasto mundo ao seu dispor para percorrer, buscar, farejar e até mesmo fazer amizades.

         Luiz olhou de soslaio o animal que chegara e não se conteve. Dele se aproximou, procurou ganhar a sua confiança, mas não chegou a lhe acariciar a cabeça, pois temia ser agredido, muito embora o cão lhe parecesse cansado e sem forças para tal. O cão também mostrou ser amigo, querer amizade, mas que antes lhe desse prova de confiança, de reciprocidade, pois estava com fome. O piso do alpendre da casa era alto e não dava para lhe alcançar, mas se aproximou. Luiz se lembrou dos bons tempos, quando nos fins de semana saía com alguns colegas de trabalho, calçando sandálias, bermuda e gorro na cabeça, predendo os cabelos que se misturavam ao sopro do vento que vinha das montanhas e do mar.

         Nesses dias ensolarados, na companhia dos amigos, Luiz era sempre o dono de si e do mundo, desse vasto mundo sem imaginação, sem cólera e sem paixões. Seus olhos passeavam pelo vasto areal ao longo da praia de Copacabana, de Ipanema, observando as mulheres, jovens, bonitas, cheias de vida, sorridentes e felizes. Algumas acompanhadas de cachorrinhos pequinês, que conduziam ou eram conduzidas pelos animaizinhos igualmente felizes por estarem passeando em outro mundo, um mundo que era também todo seu e não apenas de sua dona.

         Voltando a si, Luiz olhou para o cão e acenou com a mão direita, como quisesse dizer: – Espera aí. Vou buscar alguma coisa para você comer, meu amigo, e entrou em casa. O cão deve ter entendido o acenou e esperou. Enquanto esperava, tristonho, mas esperançoso, deu novos olhares em volta do amplo terreno, de cuja terra verdejavam plantas nativas e outras plantadas em canteiros especialmente preparados para elas.

        

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *